Política
Publicado em 17/07/2025, às 07h05 Dani Oliveira
Após o governo de Donald Trump anunciar uma investigação contra o Brasil, um ponto que chamou atenção foi a menção ao Pix. O Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR) disse, sem citar o termo Pix especificamente, que o Brasil está envolvido em práticas “desleais”, incluindo “a promoção de seus serviços de pagamento eletrônico desenvolvidos pelo governo”. Mas qual seria o possível problema do Pix na visão dos Estados Unidos?
Um dos possíveis motivos levantados por especialistas é um impacto do Pix às operadoras de cartão de crédito que atuam no Brasil, como Visa e Mastercard, ambas norte-americanas. Isso porque, com a modalidade de Pix Parcelado, prevista para começar a funcionar em setembro, muitas pessoas passariam a usar esse método de pagamento em vez do cartão de crédito.
No entanto, um estudo do Google, divulgado recentemente, mostra que o Pix tem sido usado como um complemento ao cartão de crédito, e não para substituí-lo. Dados do Banco Central (BC) comprovam essa tendência. Segundo o BC, em 2024, o Pix cresceu 52% e respondeu por quase metade (47%) do total de transações de pagamento (excluídas as em espécie) realizadas no Brasil no último trimestre do ano passado. Enquanto isso, os cartões registraram aumento no número de transações nas modalidades de crédito (+11%), débito (+2,5%) e pré-pago (+19,2%).
Pix atrapalhou serviço de pagamento do WhatsApp
Outro ponto levantado seria o fato de a implementação do Pix ter atrapalhado o lançamento do serviço de pagamento do WhatsApp no Brasil. A plataforma da empresa de Mark Zuckerberg, aliado de Trump, iria oferecer, na época, o primeiro meio de pagamentos em um aplicativo de mensagens. No entanto, o sistema foi suspenso pelo Banco Central (BC) e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), sob o argumento de risco à concorrência e à estabilidade do sistema financeiro.
A suspensão do WhatsApp Pay foi vista como um gesto de precaução pela autarquia, mas, nos bastidores, gerou desconforto na Meta e em outras empresas americanas. O argumento era que, ao impedir o serviço de avançar, o governo estaria protegendo o desenvolvimento do Pix, que ainda dava seus primeiros passos. O bloqueio durou meses. Quando o WhatsApp Pay foi finalmente liberado, em 2021, já era tarde: o Pix havia se tornado um sucesso de adoção nacional, deixando pouco espaço para concorrência.
Alternativa ao dólar
A economista Cristina Helena Mello, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) entende que o Pix incomoda o governo norte-americano por ter se tornado uma alternativa ao dólar em algumas transações internacionais que envolvem brasileiros.
“Alguns países aceitam pagamentos de brasileiros com Pix. Por exemplo, Paraguai e Panamá. Em alguns comércios, eles têm cartazes dizendo: ‘brasileiros, paguem com Pix’. Comerciantes abriram contas aqui no Brasil, recebem o pagamento aqui. E isso, antigamente, passava pelo dólar. Isso é prejudicial ao interesse de controle norte-americano. Quanto menor a demanda por uma moeda, menos ela vale”, diz.
Pix resolveu problemas do mercado brasileiro
“Ninguém sabe quais são exatamente os motivos (da menção do USTR ao Pix), apenas especulações. Para mim é um infundado. É um sistema de pagamentos que o Brasil lançou para resolver vários problemas dentro do próprio Brasil, e foi um grande sucesso, não afeta os EUA, nenhum grande banco de varejo americano atua no Brasil. O Pix é bom para economia brasileira”, defende o CEO e cofundador da fintech PagBrasil, Ralf Germer.
Ralf lembra que o Pix já era pensado pelo mercado desde 2016 e se tornou uma realidade após muito estudo do Banco Central. Trata-se de um método de pagamento moderno, pensado para um mundo mais digital e muito seguro. Ele lembra que o Pix ajudou nas relações do comércio, que ganharam uma modalidade de pagamento mais barata de se implementar e muito rápida.
Nas compras online, o usuário também foi beneficiado. “Ao fazer uma compra, quem não tinha cartão de crédito, tinha que gerar boleto, esperar 4 ou 5 dias para compensar. Quem comprava jogos online também tinha que esperar, mas quando você compra um jogo, você quer jogar hoje. O Pix resolveu tudo isso”, exemplifica.
Outro ponto levantado é a funcionalidade do Pix Copia e Cola, para pagamento de boletos (afinal, muitas vezes é difícil ler o código de barras no celular) e o Pix automático, que veio como alternativa ao débito automático, que depende de um convênio entre a empresa e o banco.
Entenda mais sobre a polêmica do PIX que está na mira de Trump
O governo do presidente Donald Trump abriu nessa terça-feira (15/7) uma investigação contra o Brasil por suas práticas comerciais e "ataques" às "empresas americanas de redes sociais", informou o representante comercial Jamieson Greer. As autoridades americanas ainda afirmam que vão investigar os serviços de pagamentos eletrônicos para avaliar se prejudicam as empresas norte-americanas.
Elas citam como exemplo as restrições à prestação de serviços no país e a tomada de represálias "por não censurar o discurso político". Na semana passada, Trump ameaçou o Brasil com tarifas de 50% sobre seus produtos exportados aos Estados Unidos. Nesta terça, Washington foi além ao cumprir sua ameaça de abertura de uma investigação sobre o Brasil, como prometeu fazer na carta destinada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que anunciava as novas tarifas aduaneiras aplicáveis a partir de 1º de agosto caso nenhum acordo seja alcançado antes disso.
"Por ordem do presidente Trump, lanço uma investigação sob a Seção 301 sobre os ataques do Brasil às empresas americanas de redes sociais, bem como outras práticas comerciais injustas que prejudicam empresas, trabalhadores, agricultores e inovadores tecnológicos americanos", declarou o representante comercial Greer, citado em comunicado.
Histórico do Pix
Criado em 2020, o Pix já é o meio de pagamentos mais utilizado no país. Em 6 de junho, o sistema bateu recordes. Pela primeira vez, a modalidade aproximou-se da marca de 280 milhões de usuários, movimentando R$ 135,6 bilhões.
Ao divulgar a informação, nesta segunda-feira (9), o Banco Central disse que o montante é o quarto maior da história para um dia. O recorde diário anterior foi registrado em 20 de dezembro de 2024, dia do pagamento da segunda parcela do décimo terceiro salário, com 252,1 milhões de movimentações.
O recorde em valores também foi registrado neste mesmo dia, quando foram movimentados R$ 162,9 bilhões.
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