Política
Publicado em 18/08/2025, às 14h32 © Marcelo Camargo/Agência Brasil Giovana Gurgel
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deve acumular pelo menos R$ 387,8 bilhões em gastos não contabilizados na meta fiscal durante o seu terceiro mandato.
O aumento decorre do pacote de socorro às empresas afetadas pelo tarifaço do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciado no dia 13, que retirará R$ 9,5 bilhões da meta até 2026.
O programa Brasil Soberano prevê R$ 4,5 bilhões em aportes a fundos garantidores e R$ 5 bilhões em renúncias de receitas do Reintegra, ambos fora da contabilidade da meta. O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), apresentou um projeto de lei complementar para autorizar a manobra, que ainda precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional.
Especialistas criticam a medida, apontando uma prática recorrente de burlar a regra em momentos de emergência, o que, segundo eles, diminui a credibilidade da âncora fiscal. De 2023 a 2026, os gastos fora da meta de resultado primário somarão ao menos R$ 387,8 bilhões, conforme dados do Tesouro Nacional analisados pelo Estadão.
O Ministério da Fazenda afirmou que 87% do montante decorre da necessidade de quitar precatórios deixados pelo governo Bolsonaro e aprovar a PEC de Transição, que recompõe despesas essenciais represadas.
Economistas calculam que R$ 334 bilhões estão fora da meta nos três primeiros anos do governo, e que pelo menos R$ 55 bilhões adicionais em precatórios serão excluídos em 2026, totalizando cerca de R$ 389,7 bilhões em quatro anos.
O valor inclui reajustes do Bolsa Família, socorro a estados em calamidade climática, ressarcimento de aposentados e pensionistas vítimas de fraudes no INSS, além do pagamento do calote dos precatórios.
Especialistas afirmam que a prática enfraquece a meta de resultado primário como indicador confiável das contas públicas, já que o déficit real continua elevado mesmo que a meta seja formalmente cumprida.
Fábio Serrano, do BTG Pactual, ressalta que a exclusão das despesas da meta pode estimular o Congresso a ampliar o pacote, uma vez que remove restrições orçamentárias que limitavam o programa.
“O arcabouço funciona para acomodar choques, mas o governo tem consistentemente mirado a banda inferior da meta, gerando impacto maior no déficit real”, explica.
Com o Reintegra, os R$ 5 bilhões de créditos tributários a exportadores aumentarão o déficit, mas serão contabilizados como se a receita tivesse entrado. Caso o governo ressarça diretamente as empresas, os gastos também ficam fora do cálculo da meta.
Nos anos anteriores, o governo já havia ampliado o espaço do teto de gastos em R$ 145 bilhões com a PEC da Transição e pago R$ 92,4 bilhões em precatórios liberados pelo STF, sem contabilizar na meta. Parte do pagamento continuou fora da regra nos anos seguintes, e propostas recentes visam adiar por dez anos o retorno desses valores à baliza fiscal.
Segundo Sbardelotto, auditor da XP Investimentos, a multiplicação de deduções casuísticas fragiliza a meta de resultado primário, que deixa de refletir de forma fidedigna o esforço fiscal do governo. “O déficit real, que impacta efetivamente a dinâmica da dívida pública, continua sendo muito maior”, conclui.