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Longo, lento e demorado. Aqui estão três palavras que definem o significado de algo que se arrasta e que leva muito tempo. Estamos falando do Inquérito Civil instaurado pelo Ministério Público Estadual para apurar denúncias de irregularidades no contrato firmado entre o Governo do Estado e a Casa da Ribeira. A celebração movimentou R$ 6,4 milhões em recursos públicos para o desenvolvimento do projeto do restauração do Museu da Rampa, em Natal. Resultado: suspeita de direcionamento e improbidade administrativa.
A denúncia foi feita por Djailson William dos Santos, um cidadão comum e sem notoriedade aparente, ainda em 2021. Ele apontou possível favorecimento indevido por parte do Governo do Estado na formalização do acordo. A partir daí, em março de 2022, o Ministério Público instaurou a Notícia de Fato nº 02.23.2121.0000048/2021-77, que evoluiu para o Inquérito Civil nº 04.23.2121.0000023/2022-36.
Já em junho de 2023, o procedimento foi aprofundado com nova autuação, desta vez sob o número 04.23.2121.0000035/2023-97. E é justamente ele que ainda tramita na 60ª Promotoria de Justiça da Comarca de Natal, que tem como titular o promotor Afonso de Ligório Bezerra Júnior. Lá, a última movimentação registrada aconteceu no último dia 12 de junho. Desde então, passados dois meses, nada de relatório conclusivo ou despacho final.
O BNews Natal procurou a comunicação do Ministério Público para saber sobre a última movimentação, questionou sobre o andamento do inquérito e perguntou se há previsão de quando o processo será concluído. As respostas foram as seguintes:
À época da instauração da investigação, o Governo do RN se pronunciou. Em nota, disse ter recebido com serenidade a recomendação expedida pela 60ª Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público da Comarca de Natal para suspensão imediata da execução do Plano de Trabalho do Acordo de Cooperação celebrado com a entidade Espaço Cultural Casa da Ribeira, com vistas à implantação do Museu da Rampa e complexo cultural.
Confirmou também que a Procuradoria Geral do Estado havia sido oficiada e que já havia designado dois procuradores para atuar no caso, além de reiterar que o acordo de cooperação questionado não envolvia a transferência direta de recursos públicos, e que confiava na probidade das condutas adotadas pelos secretários das pastas envolvidas.
No ano seguinte à instauração do inquérito, em 2022, o governo reconheceu as irregularidades. O fato foi destaque na imprensa local. Em novembro daquele ano a Tribuna do Norte publicou matéria dizendo que um relatório feito pela Controladoria Geral do Estado admitia as irregularidades no contrato firmado com a Casa da Ribeira para a elaboração do projeto “Complexo Cultural Rampa: Arte. Museu. Paisagem”, já alvo de investigação do Ministério Público. E que entre os pontos listados, a auditoria do órgão de controle havia destacado a ausência de justificativa para o preço de contratação, falta de critérios para a contratação sem licitação e captação irregular de recursos. A reportagem lembrou também, inclusive, que o contrato havia sido suspenso.
Já em janeiro de 2023, também em reportagem publicada pela Tribuna do Norte, foi revelado que o Governo do RN havia retomado o acordo de cooperação com a Casa da Ribeira para a formatação do Complexo Cultural da Rampa, mesmo o contrato sendo alvo de suspeitas de irregularidades. Na ocasião, haviam três recomendações para a suspensão: do Ministério Público, da Controladoria Geral e da equipe técnica do Tribunal de Contas do Estado.
As irregularidades apontavam ausência de justificativa para preço de contratação, falta de critérios para a contratação sem licitação, captação irregular de recursos e incapacidade técnica da Casa da Ribeira.
Já o Espaço Cultural Casa da Ribeira, explicou na ocasião que o processo havia sido retomado porque fora pautado na “legalidade, impessoalidade e moralidade administrativa”.
Primeiro, suspendeu. Depois, retomou. Por fim, encerrou de vez. Foi o que fez o Governo do Rio Grande do Norte no dia 22 de maio de 2023, quando anunciou a rescisão do contrato com o Espaço Cultural Casa da Ribeira, relativo à gestão do Complexo da Rampa. A medida foi tomada em cumprimento ao Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado com o Ministério Público do Estado no início daquele mês. Com a rescisão, a Fundação José Augusto assumiu a responsabilidade de administrar o Complexo Cultural.
TAC firmado, TAC descumprido. Em razão disso, o Ministério Público do Rio Grande do Norte, em junho de 2024, entrou com um pedido na Justiça para a execução das obrigações pactuadas no Termo de Ajustamento de Conduta firmado entre o próprio MP e o Estado. A medida foi necessária devido à falta de cumprimento das cláusulas pactuadas, que visavam resolver pendências na implementação do Complexo Cultural da Rampa.
Firmado em maio de 2023, o TAC foi o resultado de um acordo entre o MPRN e diversas entidades estaduais, incluindo a Procuradoria-Geral do Estado e as Secretarias de Educação, Cultura, Esporte e Lazer, e Turismo, além da direção da Fundação José Augusto. Entre as obrigações não cumpridas pelo Estado estavam itens essenciais para a criação do Museu da Rampa e do Museu da Segunda Guerra Mundial.
Entre as irregularidades apontadas pelo MP, estavam:
Em resposta às questões, o Estado comprometeu-se a editar um termo de referência para a contratação do plano museológico e estabelecer o regime jurídico para a exploração do museu e dos demais espaços do Complexo Cultural.
O Espaço Cultural Museu da Rampa foi inaugurado em meio a todo esse imbróglio jurídico. Aconteceu no dia 28 de janeiro de 2023, em celebração aos 80 anos do encontro presidencial de Roosevelt e Getúlio Vargas (leia mais abaixo).
O contrato para a implantação do Museu da Rampa, na ocasião, seguia questionado pelo Ministério Público. O acordo original, com a Casa da Ribeira, já havia sido extinto, e a abertura do espaço ficou a cargo da Fundação José Augusto.
O local onde hoje funciona o Complexo Cultural da Rampa foi um terminal de hidroaviões no rio Potengi, ponto obrigatório de parada dos aviadores que atravessavam o Atlântico Sul entre as décadas de 1920 e 1940. Tanto que a data de 28 de janeiro de 1943 está marcada na história de Natal. Franklin Delano Roosevelt, presidente dos Estados Unidos, e o presidente brasileiro Getúlio Vargas, se encontraram na Rampa. Na ocasião, eles celebraram a Conferência do Potengi, transformando o local em base militar americana e selaram a participação do Brasil na II Guerra Mundial.
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