Cidades
Mais um novo capítulo, agora, e ao que tudo indica, em caráter definitivo, pode colocar um ponto final nos rumos do histórico Aeroclube de Natal; que vem enfrentando uma disputa acirradíssima na justiça para defender a legalidade da permanência na ocupação do prédio localizado no bairro Tirol, endereço nobre da capital potiguar.
O Diário Oficial do Estado publicado no último dia 9 de agosto traz indicação do Conselho de Gerenciamento de Patrimônio do RN para que a Procuradoria Geral do Estado (PGE) dê seguimento legal para os procedimentos jurídicos necessários para a retomada da posse do imóvel do Aeroclube, face não ter sido atendida a requisição administrativa. A medida tem caráter irrevogável e condição imediata de desocupação.
Em entrevista exclusiva para o Bnews Natal, o secretário de administração do RN, Pedro Lopes diz que a partir de agora, com essa autorização por parte do Conselho de Patrimônio, o Governo vai entrar na justiça para realmente pedir a desocupação imediata do imóvel.
A gente já tinha feito um pedido administrativo, fizemos uma reunião com a diretoria do aéreo no início do ano, e fizemos uma petição administrativa, um ofício pedindo para ele desocupasse em 90 dias, e o prazo se extinguiu em maio.
Após o procedimento administrativo por parte do Governo do estado, ainda no primeiro semestre de 2025, o Aero Clube entrou na justiça, com alegação de que o terreno seria de propriedade da instituição.
De acordo com o presidente do Aeroclube, Jaomar Vidal, eleito no mês de agosto de 2024, os próprios sócios advogados econtribuiram para entrar na justiça para tentar reverter o caso; já que segundo ele, a entidade não tem plano B, não tendo para onde ir caso haja a desocupação.
O Aeroclube não tem pra onde ir, essa é a verdade. Não existe um outro terreno, não existe uma outra sede, não existe lugar nenhum pra sediar. Se o aeroclube tiver que sair daqui, significa a extinção do clube”, lamenta.
Para o Governo do RN, nunca houve dúvidas de que o terreno ocupado pelo Clube fosse legalmente de pertencimento do Estado.
Já nas preliminares mesmo da decisão, o juiz já nem reconheceu o pedido do Aereoclube, reafirmando que o terreno pertence mesmo ao Governo do Estado. Bom, então, como passou essa fase aí, que tem essa discussão preliminar que no nosso entendimento não tinha nenhum sentido, mas a gente venceu essa parte da discussão, agora como eles não desocuparam, houve agora a orientação do Conselho de Patrimônio para que a Procuradoria Geral do Estado entrasse com a ação pedindo a ocupação do imóvel, e é o que vamos fazer", explica o secretário.
Relembre o caso
No último mês de maio de 2025, pela primeira vez em quase um século de existência, o Aeroclube do Rio Grande do Norte recorreu à Justiça para discutir a propriedade do terreno onde está instalado desde 1928, localizado no bairro Tirol, em Natal.
A ação, intitulada querela nullitatis insanabilis cumulada com ação declaratória de nulidade, foi ajuizada contra a União e o Estado do Rio Grande do Norte e busca reverter atos de expropriação e dissolução considerados ilegítimos, ocorridos durante a ditadura militar.
O centro da disputa
O Aeroclube foi fundado em 1928 e, desde então, ocupava a área com um edifício-sede e um campo de pouso. Em 1952, a entidade recebeu formalmente a doação do terreno por meio de escritura pública lavrada com base na Lei Estadual nº 582/1951.
Durante décadas, o uso do imóvel nunca foi questionado, até que, no auge do regime militar, o Ministério da Aeronáutica cassou a autorização de funcionamento da escola de aviação, alegando descumprimento ao Decreto-Lei nº 205/67. Isso levou, em 1969, à dissolução do Aeroclube por decisão da Justiça Federal, com trânsito em julgado em 1973.
Na sequência, o imóvel foi adjudicado à União e teve seu registro transferido. O Aeroclube, no entanto, alega que jamais deixou de existir e que sua dissolução foi apenas um instrumento para permitir a expropriação do terreno, sem o devido processo legal e sem pagamento de indenização.
Nova ofensiva judicial
A ação atual propõe a nulidade dos atos praticados durante o regime militar com base em princípios de justiça de transição. Os advogados do Aeroclube sustentam que a expropriação violou o direito fundamental à propriedade e à liberdade de associação, protegidos por tratados internacionais e pela Constituição da época.
Além disso, o processo denuncia que, mesmo após a sentença que rejeitou a reivindicação de posse feita pela União em 1994, o Estado do Rio Grande do Norte teria conseguido, de forma irregular e sem contraditório, restaurar o registro do imóvel em seu nome, mediante despacho em execução de sentença que não autorizava tal medida.
Reversão questionada
A disputa é agravada pela cláusula de reversão prevista na lei de doação, que estabelecia o retorno do bem ao Estado em caso de extinção da entidade donatária. Contudo, os atuais representantes do Aeroclube afirmam que a entidade nunca foi legalmente extinta, tendo apenas sofrido perseguições políticas e administrativas durante a ditadura.
Também argumentam que a entidade manteve suas atividades esportivas e sociais, o que afastaria a alegada perda de finalidade da doação.
Um julgamento com reflexos históricos
A ação reacende o debate sobre os efeitos de atos administrativos e judiciais realizados no período autoritário e coloca o Judiciário diante do desafio de avaliar a validade de decisões que, segundo a parte autora, violaram garantias fundamentais.
A decisão do caso poderá ter repercussões tanto jurídicas quanto simbólicas, ao tocar na legitimidade da posse e propriedade de um dos espaços mais tradicionais da cidade.
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