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Sindicato dos Trabalhadores em Aplicativo do RN revela realidade da categoria: "Tratados como descartáveis"

Presidente do SINTAT/RN apresenta um panorama sobre a atividade do motorista de aplicativo, na qual ele enxerga como urgente  |  Para motoristas de aplicativo, regulamentação da profissão é uma necessidade urgente - SINTAT/RN

Publicado em 15/05/2025, às 06h53   Para motoristas de aplicativo, regulamentação da profissão é uma necessidade urgente - SINTAT/RN   Redação

"Desde que os aplicativos de transporte chegaram ao Brasil em 2014, um novo tipo de vínculo de trabalho emergiu, impulsionado pela promessa de liberdade, flexibilidade e geração de renda. No entanto, essa relação rapidamente se revelou marcada por precarização, ausência de direitos e alto custo humano e financeiro para os trabalhadores. Somos tratados como descartáveis". A fala é de Carlos Cavalcanti, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Aplicativos e de Transporte no Rio Grande do Norte (SINTAT/RN). Ele também é secretário-geral da Federação Nacional dos Sindicatos de Motoristas por Aplicativos (FENASMAPP).

Hoje, segundo Carlos, estima-se que o número de motoristas por aplicativo no Brasil ultrapasse 1,8 milhão. Cidades como Natal, por exemplo, já podem ter mais de 20 mil motoristas em atividade, embora as empresas não divulguem os números reais.

Em entrevista ao BNews Natal, Carlos apresentou um panorama sobre a atividade, na qual ele enxerga como urgente a situação da categoria, com base na vivência dos trabalhadores e nas principais reivindicações apresentadas por suas representações.

Precarização camuflada de empreendedorismo

As plataformas de aplicativo classificam os motoristas como "parceiros”, “autônomos” ou “empreendedores”. Mas, na prática, eles enfrentam as imposições típicas de qualquer relação de subordinação, ou seja, não definem o preço das corridas, não escolhem os passageiros nem os destinos, estão sujeitos a desativações unilaterais sem direito de defesa, descumprindo o princípio do contraditório previsto na Constituição, e não têm acesso ao valor total pago pelo passageiro, vivendo sob total falta de transparência nos repasses", pontuou o presidente.

Ainda de acordo com Carlos Cavalcanti, esse modelo de parceria é, na visão do SINTAT/RN, "um disfarce para a transferência dos riscos e custos do serviço para o trabalhador.

Exploração financeira e lucros concentrados

"Em média, motoristas precisam trabalhar entre 12 e 14 horas por dia para obter rendimentos líquidos entre R$ 80 e R$ 120. As promoções e bonificações que anteriormente ajudavam na renda foram drasticamente reduzidas ou extintas. O custo de operação com gasolina, manutenção, pneus, financiamento de veículo, é tudo bancado integralmente pelo trabalhador. Muitos vivem endividados, trocando o próprio bem-estar pela tentativa de garantir o sustento básico. Em áreas de periferia, motoristas enfrentam alto risco de assaltos, e as empresas não oferecem seguro adequado ou suporte efetivo", revelou.

Adoecimento físico, mental e tentativas de suicídio

A rotina exaustiva, a instabilidade financeira e o medo constante da desativação elevam o nível de adoecimento da categoria. Estes são outros pontos destacados pelo sindicato. "Transtornos como ansiedade, depressão, estresse extremo e a síndrome de burnout são comuns. Cresce o número de casos de doenças osteomusculares e cardiovasculares. Há registros alarmantes de tentativas de suicídio, como consequência do abandono e da sobrecarga enfrentada por esses trabalhadores. O motorista de aplicativo é um trabalhador solitário, invisível e sem vínculos coletivos, o que aprofunda ainda mais o sofrimento psíquico da categoria", acrescentou Carlos.

Insegurança jurídica e ausência de direitos básicos

Por serem considerados autônomos pelas plataformas, os motoristas não possuem nenhuma proteção social efetiva. Nesta situação, Carlos Cavalcanti apresentou uma lista de benefícios que também são ausentes na vida do motorista de aplicativo. "Não têm INSS, férias, 13º salário, vale-alimentação ou seguro-desemprego. Não têm proteção contra acidentes de trabalho, ainda que estejam em risco permanente no trânsito. São banidos da plataforma sem chance de defesa, muitas vezes por relatos unilaterais de passageiros. E ainda vivem à margem da legislação trabalhista, em total insegurança jurídica".

Urgência da regulamentação

"Diante desse cenário, os trabalhadores vêm pressionando o Congresso Nacional pela aprovação do Projeto de Lei que cria e regulamenta a profissão de motorista por aplicativo no Brasil. A proposta foi construída a partir de uma mesa tripartite, com a participação do Governo Federal, por meio do Ministério do Trabalho e Emprego, empresas de aplicativos e representações de trabalhadores da categoria", destacou.

Hoje, segundo Carlos, a principal reivindicação dos motoristas é uma remuneração justa baseada no tempo e na distância das viagens (por KM e tempo rodado). No entanto, sob forte pressão das plataformas, o texto encaminhado ao Congresso estabelece um valor mínimo por hora trabalhada de R$ 32,10, o que vem sendo duramente contestado pela categoria.

Situação atual

O Projeto de Lei, que inicialmente tramitava em regime de urgência, foi retirado desse status após pressão de empresas e setores conservadores. Agora, segue em análise nas comissões temáticas da Câmara dos Deputados. "Enquanto isso, seguimos sem direitos, sem garantias e à mercê de algoritmos impessoais que decidem nossa renda, nossos horários e até nossa permanência na plataforma", avaliou o presidente do SINTAT/RN.

Vidas descartáveis?

Por fim, o representante dos motoristas de aplicativo que atuam no RN também avaliou o panorama geral daqueles que precisam estar nas ruas todos os dias para sobreviver. "A situação dos motoristas por aplicativo no Brasil já ultrapassou os limites da informalidade. Trata-se de uma categoria essencial para a mobilidade urbana, mas tratada como descartável, sem qualquer amparo legal digno desse nome. A aprovação da regulamentação não é um privilégio. É uma necessidade urgente para proteger quem movimenta o país com o próprio corpo, veículo e suor. A sociedade brasileira precisa escolher de que lado está: do lucro bilionário das plataformas, ou da dignidade de quem está atrás do volante".

Classificação Indicativa: Livre


Tags Congresso Nacional Motoristas de Aplicativo SINTAT/RN Regulamentação da Profissão FENASMAPP